E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

A Chave de um Coração - Capítulo 25


Matsumoto Jun pensou mais de dez vezes em ligar para sua namorada desde que saíra da casa do Riida, mas desistiu por dez vezes. Ainda não tinha certeza se queria falar com ela, ainda mais sem saber o que dizer. Olhou no relógio: já mais de 16h, ela provavelmente estava em casa, mas ele também não queria encontrá-la.
Sabia que tinha sido bem claro pela manhã ao pedir que ela não ligasse para ele, que na hora certa ele a chamaria. Provavelmente, ela estava ansiosa por notícias de Jun. Se pegou pensando pela primeira vez desde o show do dia anterior, se tinha sido muito duro com ela. Afinal, Yui não era má pessoa, só tinha um gênio forte e o pavio curto. O que às vezes acabava afetando sua capacidade de pensar racionalmente.
Mas que droga! Ele não foi duro, ela quem foi baka o suficiente para meter os pés pelas mãos e brigar com a Karoru-chan. Se ela não o tivesse feito, talvez aqueles sentimentos todos não tivessem vindo à tona. Talvez os dois pudessem continuar namorando numa boa depois que a outra voltasse para seu país.
Contudo, agora ele estava tão bravo com Yui e, em seu coração, tinha tanta certeza do que sentia pela Caroline, embora não tivesse ainda coragem de admitir aos outros, que sentia que não conseguiria mais continuar namorando “numa boa”. Não sem ter uma boa conversa com Yui.
Ele estacionou o carro em sua vaga e subiu pelas escadas. Não queria ser surpreendido por nenhum vizinho no elevador, ninguém. Queria sentir a solidão um pouquinho, e chegando a seu apartamento, ia tentar tomar alguma decisão com relação ao que iria fazer dali para frente.
Por sorte, Yui realmente acatara sua ordem de não chamá-lo e não estava esperando-o na porta, como ele esperava que acontecesse. Tentou ouvir algum barulho vindo do apartamento dela, mas não ouviu nada, então apenas se fechou dentro de sua casa, tirou os sapatos, a jaqueta jeans que estava usando e caminhou até a cozinha, para pegar um copo d’água.
Tomou a água e voltou para a sala. Sentou-se no sofá, esticou as pernas e pousou os pés cruzados sobre a mesinha de centro. Tentou pôr ordem nos pensamentos, mas eram tantos acontecimentos desde o show de quinta-feira, quando vira as lágrimas de Caroline pela primeira vez, que sua cabeça doía. Massageando as têmporas, levantou-se e foi até o seu laptop sobre o balcão da copa, o ligou e procurou sua lista de música de The Beatles e pôs pra tocar baixinho. Voltou para o sofá. Tocava Yesterday acapella e ele começou a cantarolar de olhos fechados para descansar a vista.

***

Uemura Yui não ouviu quando ele chegou em casa, pois ainda estava dormindo. Dormiu todo o resto da tarde e parte da noite. Acordou com as buzinas dos carros lá em baixo na rua e um vento frio.
Com o lençol em volta dos ombros, ela se arrastou até a janela da sala que estava aberta – de onde vinha o vento – e olhou as luzes da cidade. As buzinas eram por causa do congestionamento. A Torre de Tóquio já estava toda iluminada. Fora no restaurante ao pé daquela torre que Jun a pedira em namoro. Agora, parecia que aquilo tinha sido há tanto tempo!
Olhou ansiosamente para o celular, esperando ver uma ligação perdida ou alguma mensagem, mas nada. Indignada com o que, para ela, pareceu descaso da parte dele, Yui nem se deu ao trabalho de prestar atenção para tentar ouvir algo vindo do apartamento dele e se dirigiu ao banheiro, pôs a banheira para encher e foi separar o pijama para vestir depois do banho.

***

Caroline estava sentada na cama, batendo impacientemente os pés no chão enquanto esperava a amiga sair do banho. Já eram 8h30 da noite e ela estava com fome. Tinham feito somente um pequeno lanche numa padaria perto do hotel há mais de quatro horas.
Naquela tarde, depois de alguma discussão sobre o itinerário, decidiram que iriam dar uma volta pelos arredores mesmo e bater algumas fotos, as primeiras depois de uma semana desde que deixaram o Aeroporto de Guarulhos. As únicas poucas fotografias foram do aeroporto de Frankfurt e eram um tanto sem graça, já que elas sequer puderam sair da área internacional do embarque/desembarque.
Débora disse que precisava comprar algum presente, já que visitaria a futura sogra no dia seguinte. Ela perguntou, ao entrarem na loja de variedades que o recepcionista do hotel indicou:
- Será que levo algo para o sr. Ninomiya também?
Carol a olhou de canto de olho, enquanto analisava os objetos de uma prateleira.
- Por quê? Não precisa levar. Você nem sabe se vai conhecê-lo amanhã ou não!
- Mas to achando que é melhor eu levar!
Ficaram procurando por uns quarenta minutos e no final, Débora escolheu um cachecol florido azul para a mãe de Kazunari e um lenço de bolso de seda marrom para o pai dele.
Depois que saíram da loja, foram até a padaria, e só depois fizeram um pouco de turismo rodando pelas ruas da vizinhança, batendo fotos aqui e ali. Eram mais de 6h quando voltaram ao hotel. Quando chegaram, Carol colocou a banheira para encher – um luxo que ainda não desfrutara - e foi a primeira a tomar banho, mas já fazia uma hora ou mais que tinha saído e Dé entrou em seguida. E agora ela enrolava e não saía nunca do banheiro.
Caroline estava quase se levantando da cama para bater na porta pela quarta vez quando ela saiu, vestindo uma calça de moletom pink e uma blusa de linha amarela-bebê, esfregando a toalha na cabeça para secar os cabelos.
- Nossa, até que enfim! Achei que você tinha morrido afogada!
- Ah, Carol, deixa de ser exagerada! – Débora soltou a toalha molhada sobre a cama e pegou o pente, passando-o sobre os longos fios negros – Eu não tenho banheira em casa, tá?
- Vamos logo então, que tô com fome! – Caroline se pôs em pé e se dirigiu à porta do quarto, já abrindo e parando em pé ao lado, com as mãos na cintura. – Você vem ou não?
- Nossa, to indo! – ela jogou o pente no colchão, deu uma rápida olhadela no espelho, para não perder o costume, e pegou a bolsa que estava no aparador.
Já acomodadas no restaurante, numa mesa no canto do salão, para não se misturarem muito, elas fizeram os pedidos e enquanto esperavam, Débora pegou a máquina dentro da bolsa e começou a olhar as fotos tiradas naquela tarde.
- Essa praça é muito linda, né Carol? – Dé se aproximou da amiga, apontando para a imagem no visor do aparelho.
- Sim, é – nesse instante, Débora passou para a foto seguinte. – E daqui dá pra ver a Tokyo Tower, né? – Carol apoiou o cotovelo sobre a mesa e segurou o queixo com a mão, com um olhar vago e sonhador – Quero ir visitá-la!
- Nós vamos, com certeza!
- Você tem a vida toda pela frente... ou vocês vão morar no Brasil? Não né? – Carol fez um gesto negativo com a mão livre – Não viaja, Caroline! Simplesmente é impossível, sua imbecil! E o Arashi? – dando um tapa na própria cabeça.
- Hahahaha! – Débora ria da outra – Só você mesmo! De qualquer forma, nós vamos. – apontando para as duas com o dedo – Você vai ficar, afinal, por causa do Matsujun – concluiu, com um sorriso malicioso.
- Ih, lá vem você de novo! – ela revirou os olhos, tirando o cotovelo da mesa e abrindo espaço para que o garçom (o mesmo que a atendera no sábado, quando Débora foi almoçar com Nino e voltou noiva) colocasse o prato – Mas amanhã ficarei o dia todo aqui sozinha, já que você vai passar o dia com seu noivo. – o garçom olhou para elas com algum interesse, mas não disse nada.
Débora guardou a máquina fotográfica e também abriu espaço para o garçom. Quando ele foi embora, Carol já comia.
- É, você está mesmo com fome! – disse, enquanto levava a primeira garfada à boca (elas não tinham se aventurado ainda a usar os hashis).

***

No dia seguinte, Débora foi a primeira a acordar, ainda 8h, e foi tomar uma ducha. Queria ter tempo suficiente para fazer a primeira refeição do dia de forma digna antes que Ninomiya Kazunari chegasse para buscá-la. Quando saiu do banheiro, meia hora depois, Caroline já estava acordada, trocada e pronta pra descer.
- Ué, não vai tomar banho? Vai ficar fedida? – caminhando até a amiga e fazendo cócegas em sua barriga, sorrindo, com os cabelos, ainda molhados e despenteados, caindo sobre os ombros.
- Não estou fedida, sua boba! E vou tomar café com você, tomo banho depois, quando você já tiver saído.
Depois que Caroline fez sua higiene matinal e Débora já estava pronta, maquiada (coisa pouco, somente um blush leve, sombra, lápis e batom) perfumada e de cabelos penteados, elas desceram e depois de aproveitarenm bem a refeição, Débora foi no banheiro da recepção e escovou os dentes.
Ás 10h em ponto Nino chegou para buscá-la. Esta se adiantou e foi a seu encontro quando ele adentrou o hall usando uma boina que cobria parcialmente sua cabeça e óculos escuros que vinham bem a calhar, no sol forte que brilhava lá fora, à despeito do vento um tanto frio. 
Sem pensar muito, numa atitude completamente espontânea, como era de se esperar dela, Dé outra vez pulou no pescoço dele. Só que dessa vez, além disso, deu-lhe um beijo gostoso na boca. As pessoas que andavam por ali, tanto funcionários como turistas, voltaram-se para olhar a cena, alguns com olhar reprovador, aqui e ali um cochicho de “tinha que ser gaijin mesmo” que somente Caroline ouviu, e outros com um sorriso tímido e maroto. Carol tapou o riso com as mãos e caminhou calmamente até a amiga.
Kazunari, ao contrário do que se podia pensar, segurou-a pelas costas e a levantou alguns centímetros do chão, retribuindo o beijo.  Passaram-se um ou dois minutos, nos quais Carol apenas ficou observando, parada atrás dos dois, morrendo de vergonha.
Quando a cena romântica acabou e Nino deixou Débora no chão, ela se aproximou, tocou o ombro da amiga e comentou:
- Caprichou, hein!
- Para nosso primeiro beijo, foi muito bom – piscando para o outro, que estava parado ao seu lado e segurava sua mão.
- Não creio! Primeiro beijo? Então aquele encontro de sábado não serviu para nada? – Carol riu e se virou para Nino – Ohayou gozaimasu!
- Ohayou, Karorine-san.
- É Carol, Nino.
- Hai, hai – ele fez um gesto afirmativo com a cabeça – Daijoubu?
- Uhm.
- E você, princesa? – olhando para Débora.
- A princesa sou eu? – suas bochechas se pintaram de rosa e ela baixou os olhos – Estou muito bem.
- Ficou tímida agora, dona Débora? – Carol fez chacota da amiga – Não estava tímida quando pulou no pescoço dele, hahaha. – estendendo a sacola com os presentes.
- Arigatou – Débora olhou para ela e sorriu.
- O que é isso? – Nino tentava espiar dentro da sacola, que Débora segurava com a mão livre.
- Presentes para seus pais.
- Mas não veremos o otousan.
- Isso – Dé soltou a mão dele tirou o pacotinho com o lenço de dentro da sacola – pode ser dado outro dia então, mas vou levar mesmo assim.  – soltou novamente o lenço na sacola e segurou a mão de Nino.
- Etto... jya ne, Karo...ru-san. – ele começou a se virar para a saída e puxou Débora consigo.
- Jya, Nino! Jya, Dé!
- Jya, Carol!
Quando eles saíram, Caroline subiu ao quarto com planos de tomar banho. Sozinha ali naquele hotel, aquele seria um dia longo.
Depois da rápida ducha (não estava mesmo suja, afinal tomara banho antes de deitar, no dia anterior), ela saiu do banheiro e ficou se olhando no espelho por alguns minutos. Olhou para a mala semi-desfeita ao lado da cama. Viu a bolsa com as lembranças do show e não conseguiu conter um sorriso. Balançou a cabeça e falou para sua própria imagem no espelho em voz alta:
- Carol, definitivamente você está encrencada! Onde já se viu se apaixonar pelo Jun? – e riu sozinha. – Quer saber? – pegando a bolsa sobre o aparador e colocando-a sobre o ombro - Já que eu fiquei aqui, então vou aproveitar! Tenho o dia todo sozinha. Você acha mesmo, Caroline, que eu vou ficar aqui morgando o dia todo? – fez biquinho e passou o batom cor-de-pele nos lábios, saindo em seguida.
Já que a amiga foi “visitar os futuros sogros” e a deixou no hotel, no mínimo ela tiraria muitas fotos naquele dia só dela e evitaria pensar no Matsujun enquanto isso.
Na recepção, perguntou por um bom restaurante.
- Tem um muito bom três ruas para trás daqui, um quarteirão seguindo a esquerda, se for a pé...
- Hai. Eu vou a pé.
- Então, deve demorar apenas uns quinze minutos. Demo... – e o recepicionista calou.
Ele sabia que aquela turista burajirujin e a amiga dela, que saiu mais cedo com um rapaz, não se davam bem com hashis. Contudo, tinha receio de tomar liberdade demais e falar algo desnecessário. Ao mesmo tempo, sabia que era seu dever como bom profissional passar as informações completas ao hóspede.
- Nani? Pode falar. – Carol sorriu simpática.
- Ano... gomen, se eu falar algo inadequado... mas nesse restaurante... eu não sei se tem talheres. Então talvez seja melhor você ir a outro, um pouco mais a frente, no mesmo sentido, na mesma rua.
- Mas esse primeiro que você falou é realmente bom?
- Hai! O melhor da região, sem dúvida.
- Então, está decidido, eu vou almoçar ai. Se eles não tiveram talheres, darei um jeito. Afinal, estou no Nihon, não é mesmo?
Ela sorriu novamente, virou-se para a saída e acenando um tchau, deixou o hotel.

***

Matsumoto Jun acordou na mesma hora em que Caroline saiu para fazer seu passeio naquela manhã clara e um pouco gélida, com uma brisa leve e um sol forte, um mês depois do início do outono.
Ele sabia que aquela folga não duraria para sempre, segunda-feira acabaria e começaria tudo outra vez... gravações dos programas semanais de TV, entrevistas, apresentações, os preparativos para os shows que teriam sequência na próxima semana, os compromissos intermináveis todos os dias, acordar 6h da manhã e ir dormir só às 2h da madrugada: resumindo, o corre-corre que é a vida de todo artista.
Mas, enquanto ele tinha esse tempinho raro para não fazer nada, queria aproveitar. E a melhor forma era dormir, não era? Se ficasse mais um pouquinho na cama, ninguém ia reclamar. E ainda tinha muito em que pensar. Esticou-se todo, bem no meio do colchão, abriu pernas e braços e ficou ali deitado, com o cobertor sobre o corpo.
Quando estava quase pegando no sono novamente, lembrou-se de Yui e arregalou instantaneamente os olhos, fitando o teto. Ainda não sabia exatamente o que falaria a ela, mas tinha que fazê-lo naquele dia sem falta! Não podia mais postergar...
Sentou-se na cama, cruzou as pernas e se colocou a refletir. O que afinal iria fazer? Estava... realmente gostando da brasileira, embora não gostasse de ter que reconhecer isso. Mas ela era simplesmente uma turista que ia embora pro outro lado do mundo – dissera isso para o Nino no dia anterior – no fim da semana.
Para Nino era fácil. Ele até conseguira a aprovação do chefão para namorar e noivar com uma burajirujin. Ainda havia aquela história mal-resolvida do casamento no exterior, mas mesmo assim o amigo estava numa situação muito melhor. Pra começo de conversa, não tinha uma namorada de quem tinha “desapaixonado” e tinha que desistir.
Ahhhh, não sabia como agir! Com a mente ou com o coração? A razão dizia que ele devia esquecer essa paixão idiota, esse amor impossível por essa gaijin e ficar com a Yui, que já era sua namorada há tanto tempo, e se casar com ela! Mas seu coração dizia exatamente o contrário.
Ele baixou a cabeça até o meio das pernas e começou a dar pequenos tapas, para ver se chegava a alguma conclusão, mas não vinha nada. Resolveu então se levantar e tomar uma ducha pra refrescar as ideias.
Depois do banho, fez um rápido desjejum e, como não tinha nada para fazer, se jogou no sofá e pegou um livro pra ler. Pensou no que faria de almoço e decidiu que não compensava fazer uma refeição somente para si. Depois de alguns minutos de leitura, na qual não conseguia se concentrar, resolveu dar uma ligada para Yui chamando-a para comer com ele. Não decidira ainda o que dizer a ela, apostava no momento em que estivessem juntos, para então tomar uma decisão. Embora soubesse muito bem qual a decisão certa a tomar.
Caroline era sua amiga de cartas, e não podia passar disso. Yui era sua namorada. Definitivamente, seria muito melhor para todos se as coisas continuassem assim. Mas então, por que pensar nisso era tão insuportável? Por que só de imaginar-se beijando novamente os lábios de Yui, sentia seu estômago revirar?
Novamente sentiu uma pontada de dor bem no centro da cabeça, como se seu cérebro estivesse cansado de tanto pensar e nunca chegar à conclusão alguma. Massageando as têmporas, alcançou a mesinha do telefone e discou. Chamou algumas vezes até cair na caixa postal. Tentou duas vezes o celular, mas aconteceu a mesma coisa.

***

Uemura Yui chegou a uma conclusão antes de seu namorado. Quando ele ligou, ela ouviu o celular tocando dentro da bolsa no banco do passageiro, mas reconheceu que era ele pelo toque e não atendeu. Quando ele insistiu, novamente ela não atendeu. Ficara o dia anterior inteiro, e parte da noite, esperando uma ligação dele, e nada. Agora, quem não queria falar com ele era ela!
Não tinha dúvidas sobre para onde ia. Pisou fundo no acelerador.

***

Débora e Nino chegaram à casa da mãe dele depois de enfrentarem um pouco de trânsito. No início da semana, Tóquio é tão movimentada como São Paulo, Débora refletiu.
Nino estacionou em frente ao pequeno sobrado onde sua mãe morava sozinha desde que sua irmã casou, há cinco anos, eram mais de 11h, pois a casa ficava num bairro mais afastado do centro de Tóquio. A casa era simples e bonita, e lembrou à Débora sua própria casa, onde morava com os pais no Brasil. Tinha um pequeno jardim na frente e do lado ficava a garagem, mas Nino anunciou que sua mãe andava apenas de bicicleta e não tinha carro nem carteira de motorista. Do outro lado, tinha um pequeno corredor que era fechado com um portãozinho, e ela ouviu o latido de um cachorro.
- É apenas um pequeno Spitz Japonês, Natsuko. – Kazunari a tranquilizou, abraçando-a, quando ela se encolheu toda; sempre tivera medo de cachorros.
- Que raça é essa? É muito perigoso? – ela se agarrou ao braço dele.
- Veja – e ele segurou-a pela cintura e a levantou alguns centímetros do chão.
Ela então espiou por sobre o portão um belo cachorrinho branco, todo peludo e inofensivo, e deu um suspiro de alívio. Nino deu um sorriso para ela:
- Agora, vamos entrar que a okaasan está esperando.
- Como estou? – Débora correu a mão esquerda pelo corpo, ajeitando a roupa, enquanto com a outra segurava a sacola com os presentes.
- Linda – pegando a mão dela. – Ikimasho!
- Não veremos seu pai mesmo? – ela deixara o presente dele no carro.
- Não, ao menos hoje não. – abrindo a porta e puxando-a para dentro.
- Okaasan! – Nino gritou, enquanto tirava os sapatos e Débora fazia o mesmo – Tadaima!
A senhora, que já tinha fios brancos na cabeça, mas via-se na face que conservava a juventude, apareceu vindo do corredor que, Débora imaginou, levava à cozinha, pois ela secava as mãos em um pano de prato e um cheiro delicioso de comida sendo preparada invadiu a sala vindo daquela direção. Instantaneamente, Kazunari levou a mão ao estômago e comentou, de olhos fechados:
- Uhm... ai que fome que me deu agora! Que cheiro delicioso!
- Você sempre faminto – disse rindo a mãe de Nino, vindo ao encontro dele - Estou preparando Teppan-Yaki de frutos do mar. Okaerinasai! – olhou em direção à moça ao lado do filho. – Esta é sua noiva, Kazu?
- Hai!
- Watashi wa Débora desu. Hajimemashite! – ela se adiantou, meio envergonhada, ainda segurando firme a mão de Kazu, afinal nunca ficara noiva antes nem fora apresentada para a família do noivo.
- Kochirakoso! – a senhora tocou seu ombro.
- Yoroshiku onegaishimasu! – se curvando.
A mãe de Nino a segurou pelos ombros e a ergueu gentilmente, dando um sorriso. Débora então estendeu a sacola com o presente.
- Aceite isso, onegai. Não sei se a senhora vai gostar ou não.
- Não precisava ter se preocupado. – tirando o cachecol de dentro da saccola e admirando-o. – É lindo! Arigatou, Débora-san. Ano... Kazu – ela se virou para o filho – eu chamei seu pai para o almoço.
- Majide?! – ele temera que sua mãe fizesse isso, mas achava que seu pai estaria trabalhando na segunda-feira, de qualquer forma.
- Hai! Ele... errr... eu pensei que vocês precisam conversar. Sobre o noivado e tudo o mais. Você sabe como ele é, né? – ela olhou meio pesarosa, mas tentando dar um sorriso genuíno.
- Okaasan! Eu achei que a senhora não sabia onde ele morava! Além disso, hoje é segunda-feira, ele não está no trabalho?!
- E eu não sabia mesmo para onde ele foi, mas antes de se mudar, ele me deixou o número de telefone e também o email. Falo com ele em intervalos de alguns meses. Mora numa cidade aqui perto, então virá sem problema algum. Ele faltará o serviço hoje para vir.
- Demo... – Nino lançou um olhar para Dé, que estava encolhida, de cabeça baixa, ainda apertando sua mão. Diminuindo o tom de voz, prosseguiu:
- Ele não vai fazer nada, né?
- Ele nem sabe... – respondeu a mãe, no mesmo tom baixo - ...que você está noivo. É melhor você mesmo falar.
- De qualquer forma – e ele segurou o queixo de Débora, erguendo-o suavemente – ele pode gostar ou não. Eu não mudarei de ideia. E você, Deb?
Ela somente balançou a cabeça negativamente. Por aquela pequena conversa do Kazu e da mãe, a impressão que teve não foi muito boa. Pela primeira vez desde que chegara do Brasil, se sentiu uma intrusa ali.
De repente, alguém bateu na porta. Como ninguém tinha saído da entrada ainda, Ninomiya Kazunari se virou e a abriu, dando de cara com o homem que era seu pai e que não via há tanto tempo.
- Oi, Kazu. Hisashiburi.
- Oi, otousan.
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N/A: não sei quantas pessoas sabem o que é Teppan-Yaki, então resolvi procurar por uma foto^^

Nunca comi, hihi. Tem num restaurante aqui do lado de casa, nunca experimentei. Mas tem uma cara boa^^





E, da mesma forma, resolvi ir atrás da foto de um Spitz Japonês, o cachorrinho da mãe do Nino.
Lindo, né? Eu achei uma graça...

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